O Sistema Fortificado de Elvas

Cidade de Elvas
 

O presente inventário temático sobre o Sistema Fortificado de Elvas procura traçar brevemente a evolução das várias fortificações da cidade, construídas desde a Idade Média até ao século XIX, em resultado da sua importante localização geográfica, e proceder à sua caracterização arquitetónica. Simultaneamente, procura revelar o seu caráter único e singular no panorama nacional, bem como a nível mundial, ao ponto de estas fortificações terem sido integradas na Lista Indicativa de Património Mundial da UNESCO, a 30 de junho de 2012, na categoria de “Cidade-Quartel-Fronteiriça de Elvas e suas Fortificações”.

Implantada numa zona de fronteira, Elvas, desde muito cedo, tornou-se um núcleo urbano de grande relevância e com elevado número de habitantes, que importava defender. A primeira fortificação construída, do período da ocupação árabe, foi sendo sucessivamente ampliada, para envolver a urbe e melhorada, para responder ao avanço da pirobalística. Em meados do século XVII, após a independência de Portugal face a Espanha, Elvas tornou-se numa praça de guerra de primeira linha, que urgia reforçar com uma nova e moderna fortificação, ao mesmo tempo que, depois de ultrapassados os desentendimentos entre os vários engenheiros militares, se procedia à fortificação de um padastro a sul da cidade. No século XVIII, a evolução da artilharia determinou a necessidade de fortificar o monte da Graça, que se tornara um padastro à praça e, no século XIX, no âmbito das Guerras Peninsulares e perante a iminência de uma nova invasão francesa, houve que colmatar as deficiências do campo entrincheirado sentidas na batalha das Linhas de Elvas, fortificando pequenos outeiros nas imediações da praça e do Forte de Santa Luzia.

Todas estas fortificações de distintas tipologias permanecem na cidade, numa escala de grandiosidade, integridade e bom estado de conservação excecional e únicas no país. Para além disso, Elvas e o seu conjunto de fortificações abaluartadas constitui, segundo Domingos Bucho, o maior campo entrincheirado de fortificações abaluartadas terrestres, de fosso seco, do mundo (Bucho, 2008, p. 58).

 
 

Descrição

A cidade de Elvas localiza-se na região do Alto Alentejo, na zona de fronteira com Espanha, em posição estratégica privilegiada, em frente da cidade de Badajoz, que se situa a poucos quilómetros para nascente. Essa zona tornar-se-ia, simultaneamente, ao longo da história, um dos principais eixos naturais de penetração no território português, utilizadas nas invasões por via terrestre, dado estar na proximidade do acesso mais direto a Lisboa e da antiga estrada romana de Augusta Emerita a Olisipo.

O sistema fortificado de Elvas é composto por um castelo, construído na zona mais elevada, a partir do qual se desenvolveu para sul a povoação, delimitada por duas linhas de muralha árabes, de traçado ovalado, seguida de uma terceira cerca urbana, construída na segunda metade do século XIV, denominada por muralha fernandina. A envolver o castelo e os vários núcleos urbanos muralhados surge uma fortificação moderna, construída em meados do século XVII, com traçado abaluartado, seguindo as principais características da escola holandesa, do primeiro método holandês de fortificação, hoje apenas interrompido sensivelmente a sudoeste, e, a cerca de 400 metros a sul da cidade, por um forte destacado, o Forte de Santa Luzia, com traçado abaluartado e características inovadoras, interligando-se à praça por caminho coberto. A norte da cidade, e a menos de 2 quilómetros, implanta-se o Forte da Graça, construído na segunda metade do século XVIII, com traçado abaluartado, segundo a escola de fortificação francesa, do primeiro método do marquês de Vauban, mas com características que revelam uma evolução sobre o sistema de Vauban e antecipam inovações posteriores. O sistema fortificado é complementado por três pequenos fortins, construídos em 1811, à semelhança dos fortes das denominadas Linhas de Defesa de Lisboa, ou Linhas de Torres: o Forte de São Mamede, a sudeste da Praça de Elvas e do Forte de Santa Luzia, o Forte de São Pedro, a poente do de Santa Luzia e a sul da Praça, e o Forte da Piedade, a cerca de 700 metros a poente da praça e a sul do Aqueduto da Amoreira.

AS FORTIFICAÇÕES DA IDADE MÉDIA

A ocupação muçulmana do território de Elvas terá ocorrido pelo século VIII, na sequência da qual a povoação é envolvida com muralhas. Apesar da escassez de fontes para a época, isso mesmo se depreende das palavras do geógrafo al-Idrîsî, no século XII, uma vez que este designa Elvas como uma madîna e um (…) lugar fortificado, posto nas faldas de um monte, rodeada de uma planície semeada de habitações e de bazares ou mercados, famosa ainda pela formusura das suas mulheres (…) (Rodrigues e Pereira, 1996, p. 26).

No século XIII, durante o período almóada, é provável ter-se procedido à consolidação das muralhas da povoação, abrangendo a alcáçova e a muralha da medina, e o reforço e ampliação do al-qasba, o que poderia explicar o insucesso das várias tentativas de conquista cristã. O próprio D. Sancho II (1202-1248), em 1226, cerca Elvas mas não a consegue tomar, enquanto Afonso IX de Leão (1171-1230), numa investida concertada, tenta apoderar-se de Badajoz. A conquista definitiva de Elvas ocorrerá poucos anos depois, entre 1229-1230, não havendo concordância entre os historiadores quanto à sua data específica. A conquista teve a participação de freires portugueses de várias ordens militares, mas D. Sancho II reserva a povoação para a Coroa.

Não houve uma conquista propriamente dita, mas o abandono da urbe pela população muçulmana, durante a noite, após ter conhecimento da derrota sofrida por Ibn Hud perante Afonso IX, nas imediações de Mérida, conseguindo assegurar o controlo do vale do Guadiana, pela hoste leonesa. A fortificação seria então ocupada por um grupo de freires portugueses, que mandaram informar o rei, o qual aí estabelece um grupo de cavaleiros seus, sendo nomeado como primeiro alcaide-mor de Elvas Gonçalo Martins. Com a povoação desertificada, D. Afonso III (1210-1279) enceta uma política de revitalização de Elvas, concedendo carta de feira, no final de 1262, e confirmando o foral anterior, em março de 1263.

À data da ocupação, existiriam, então, um al-qasba e duas cercas urbanas, desenvolvidas a partir do al-qasba, implantado no topo norte da alcáçova. A muralha da alcáçova, de planta ovalada com três portas, tinha um perímetro de cerca de 540 metros. Atualmente é delimitada pela Rua Martim Mendes, Largo das Portas do Sol, Ladeira e Beco das Freiras, Largo de Santa Clara e Calçadinha do Castelo, e encontra-se integrada ou absorvida no casario que a oculta, de difícil perceção em algumas zonas e é já inexistente noutras, devido às demolições sucessivas para o crescimento da urbe.A muralha da medina, com dezasseis torres e quatro portas,conserva grande parte do seu perímetro, que tinha cerca de 1300 metros, encontra-se limitada pelas atuais ruas Sá da Bandeira, de Brás Coelho, da Cadeia e de João Pereira de Abreu, desenvolvendo-se, igualmente, entre o casario, que a ela se adossou ou se sobrepôs.

Durante os séculos XIII e XIV, procedeu-se à reconstrução do castelo e das duas cercas árabes, possivelmente devido a danos causados nos vários cercos realizados durante as guerras com Castela. Aquando dos conflitos, numa carta de 1338, D. Afonso IV (1291-1357) mandara retirar certos privilégios a alguns vizinhos de Elvas, por terem abandono a vila, ao tentarem fugir à guerra, já que a defesa das povoações raianas dependia do apoio da população. Neste período, há referências documentais à “porta nova”, às portas dos Banhos, de Santiago, do Bispo, com fosso e barbacã, e à porta de São Martinho.

Em meados do século XIV, ainda durante o reinado de D. Afonso IV, deu-se início à construção da terceira cerca urbana, denominada cerca fernandina, cerca nova ou “çerqua de fora”. Desenvolvida a partir da cerca da medina, aproveitando, em algumas zonas, sobretudo nos extremos, o seu antigo traçado, teria um perímetro aproximado de 2200 metros, envolvendo uma área com cerca de 30 hectares e compondo-se de vinte e duas torres e onze portas, segundo alguns autores. Fernando Branco Correia, acha possível que, por esta mesma data, algumas das torres maciças da época islâmica, tenham sido revestidas de alvenaria para evitar a degradação da taipa (Correia, 2013, p. 162). A título de exemplo, a torre da cadeia, da segunda cerca, construída sobre o espaço da feira, possuía uma lápide, inicialmente colocada na sua face sul e atualmente num museu da cidade, com a data de 1367 e inscrição a comemorar a sua construção ou reforma levada a cabo pela câmara.

Durante a centúria de Quinhentos, decorreram obras nas muralhas, tanto de reparação das duas cinturas árabes, como na cerca de fora, tendo contribuído para tal as rendas do concelho e a população. É sabido que, logo em 1408, os cavaleiros se queixam ao rei de serem obrigados a participar nas aduas das obras que se faziam na vila, bem como a irem cortar carrasco para os fornos de cal. Em 1436, D. Duarte decidiu que 2/3 das receitas do concelho se destinassem a obras, essencialmente de caráter defensivo em Elvas. Poucos anos depois, nas Cortes de 1441, os representantes do concelho conseguem que o rei atribua para as obras apenas 1/3 das ditas rendas e não metade, como então se praticava para a reparação das fortificações da vila, ao mesmo tempo que tentam assumir funções de fiscalização. Tal é conseguido em 1469, quando D. Afonso V outorga ao “povo miúdo” a direção dos trabalhos de reparação das muralhas e do castelo, propondo-se o povo a gerir a terça das rendas do concelho.

Com a conclusão da cerca fernandina, no terceiro quartel do século XV, a cerca da medina islâmica, ou “çerqua do meo”, vai sendo relegada para plano secundário, passando a ser absorvida por novas construções, ainda que mantendo os acessos desimpedidos, para permitir a sua utilização, caso a cerca de fora não resistisse a um eventual assalto inimigo. Assim, desde meados do século XV, que existem referências documentais à sua barbacã e à ocupação da liça para construção de casas, nomeadamente pelo rei, que as afora a várias pessoas. Aliás, um dos rendimentos fixos do concelho provinha dos foros de casas e chãos implantados ao redor da “barreira da cerca velha”, que rendiam anualmente cerca de 200 reais para o concelho. Ocasionalmente, concedia-se também licença para tapar ameias da muralha, evidenciando-se a sua apropriação pelas construções particulares, como a que foi concedida a Francisco Rodrigues, a 1 de abril de 1472. O processo de ocupação da liça foi-se acentuando com o avançar da centúria, provocando queixas por parte do povo.

Em finais do século XV, inícios do seguinte, procedeu-se a alterações, mais ou menos significativas, no castelo, para melhor responder ao avanço da pirobalística. Assim, entre 1488 e 1490, iniciaram-se obras de reconstrução, nomeadamente na torre de menagem, e a construção de uma torre poligonal, na mesma frente, mas no ângulo oposto ao da torre de menagem, com acesso independente, colocando-se as armas de D. João II sobre a porta da vila.

No início do século XVI, o castelo, pelo menos parcialmente, era rodeado por uma “cava”, encostando-se a ela algumas casas de habitação, e fez-se a reparação dos muros do castelo e de três torres, então arruinadas.

Duarte de Armas (1465-?) desenha o castelo e a vila de Elvas, por volta de 1509. O castelo, de planta regular, tinha num dos ângulos das muralhas a torre de menagem, com 9 varas de largura por 8 de comprimento e 19 de altura, e 1 vara e meia de espessura, abobadada e tendo inferiormente cisterna. Dela partia um dos muros da vila e, entre ela e uma torre, com 4 x 4 varas e 2 passos, da altura da muralha, que tinha 8 varas, abria-se a porta principal, protegida por barbacã da porta, com troneira. Do lado oposto à torre de menagem, implantava-se de ângulo uma torre facetada, que ainda não estava acabada. Na frente poente, também integrada no ângulo e partir da qual se desenvolvia o outro muro da vila, existia uma torre, de 4 x 5 varas e com 11 varas de altura, e um cubelo de quatro varas sensivelmente a meio, abrindo-se junto deste a porta falsa, protegida por uma barbacã, seccionada. Na frente noroeste existia uma outra torre saliente, com 3 varas de largura e 9 de altura. No interior, o castelo era circundado pelos aposentos do alcaide, alguns sobradados, tendo no ângulo sudeste uma cisterna.

Na vista a partir do sul, observa-se a muralha fernandina, bem destacada a envolver o burgo, com espaços livres na malha urbana, em aparente bom estado, ameada, com torres quadradas colocadas espaçadamente, envolvida por barbacã comprida, cujas torres tinham talude e troneiras, e ainda um fosso, junto à qual Duarte de Armas faz a legenda mujto bõoa barreyra e caua; para poente havia ainda indicação da existência de uma das portas desta muralha. Num plano mais elevado, é representada a muralha islâmica, já com alguns sinais de ruína, com torres quadradas implantadas num ritmo mais apertado, destacando-se, para nascente, uma muito alta, coberta por um coruchéu e identificada como a torre do Relógio, e, para poente, é representada uma outra torre facetada e rematada em parapeito ameado.

Na vista a partir do norte, surge individualizado o castelo, em bom estado, com as suas torres, sendo a de menagem mais alta. Os aposentos do interior são coroados por chaminés, mas a diferenciação das várias cinturas de muralha é mais difícil de estabelecer. Sobre o casario sobressai a Torre do Relógio e a delimitá-lo, incluindo o Convento de São Domingos, distingue-se uma cintura de muralhas, com torres quadradas, ameadas e em bom estado, sinalizando-se ainda duas portas, protegidas por barbacãs. Junto ao castelo, sobre um troço de muralha com torre, tem a legenda aquj esta a porta falça.

A 1 de junho de 1512, D. Manuel I (1469-1521) concedeu foral novo a Elvas, e no ano seguinte, a 20 ou 21 de abril, elevou Elvas a cidade, que de acordo com o Numeramento de 1527, seria uma das mais povoadas do reino, com cerca de 8 000 habitantes. Em 1538, o rei deslocou os Paços do Conselho para a Praça da Sé, rasgada de novo, adossando à muralha islâmica o edifício construído. Junto deste, D. João III mandaria construir a cadeia, encimada pelas casas do Juiz de Fora, determinando, em 1545, a mudança da porta da mesma por (…) ser antes a sua serventia por dentro da Cadeia (…) (Memórias Paroquiais da Sé, 1758, p. 167).

Um alvará régio, de 26 de fevereiro de 1569, determina a abertura do Arco da Praça, na segunda cerca, sob os Paços do Concelho, e a 15 de janeiro de 1571, a câmara apresenta ao rei uma proposta de alteração da Porta Nova, para se fazer (…) ao direito, devido aos (…) perigos de transito (…) (Correia, 2013, p. 166), o que é autorizado, mas apenas concretizado dezoito anos depois. De facto, só depois de um novo alvará, datado de 22 de setembro de 1589, é que se procederá à abertura de um novo acesso, sem cotovelo, através de um túnel rasgado sob a torre albarrã, sensivelmente como hoje existe, passando posteriormente a chamar-se à nova abertura Arco de Nossa Senhora da Encarnação, ou Porta Nova do Salvador, devido ao nicho com a Senhora ali construído. Possivelmente, será também nesta data que se procederá à alteração das faces posteriores da dita torre albarrã e se desmantela a barbacã na zona da Rua João Pereira de Andrade.

AS FORTIFICAÇÕES DO SÉCULO XVII

No dia 1 de dezembro de 1640, depois de um golpe de Estado, Portugal declara independência face à monarquia espanhola, pondo fim a sessenta anos de união ibérica. Logo a 11 de dezembro, D. João IV (1604-1656), cria o Conselho de Guerra para tratar dos assuntos militares e, pouco depois, são formados os Governos de Armas do Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo e Algarve, correspondendo a cada uma das seis províncias, escolhendo-se para governador das Armas do Alentejo D. Afonso de Portugal, quinto conde de Vimioso, que elege Elvas como praça de armas da província.

Em março de 1641, D. Afonso de Portugal (1591-1649) e Matias de Albuquerque (c. 1580-1647), seu sucessor como governador das Armas do Alentejo, inspecionam as muralhas de Elvas e mandam proceder a algumas reparações e a construção de várias obras. O reforço das estruturas medievais era premente, não só por estarem obsoletas, devido ao avanço tecnológico da nova artilharia, como à necessidade de fazer frente ao iminente perigo de invasão, já que fora por Elvas que o exército espanhol, comandado pelo duque de Alba, entrara em Portugal em 1580.

No castelo, deve ter-se procedido ao corte das torres da frente noroeste e ao alargamento do respetivo adarve, com integração da cobertura do corredor da porta falsa e cisterna, e ao reforço interno do ângulo nascente, o único sem torre, criando uma plataforma de tiro. Nas muralhas e barbacãs, alteraram-se os parapeitos, acrescentando-lhes banquetas largas, deixando entre as muralhas e a barbacã uma falsa braga. Mandou-se cortar as árvores da Alameda, construir um revelim à frente das portas de Olivença e demolir algumas casas por embaraçarem a antiga muralha. Possivelmente fizeram-se também algumas obras provisórias em terra no cabeço de Santa Luzia, do Sizo, Casarão, São Pedro e no outeiro de São João.

Pela mesma altura, no pequeno outeiro da Capela de Santa Luzia, a sul da cidade e que constituía um padastro para a mesma, mandou-se cortar todas as árvores da envolvente, para não embaraçarem a defesa da cidade, e Matias de Albuquerque (1580-1647) abre “minas” para a construção de um reduto, com capacidade para trezentos soldados. Pouco depois, Sebastião Frias redefine o seu traçado para ter a forma de estrela e, em agosto do mesmo ano, Martim Afonso de Melo (c. 1600-1671), segundo conde de São Lourenço, chega a escrever a D. João IV a queixar-se da paralisação das obras por não haver engenheiros capazes de levantar a muralha. Em outubro, a obra já estava adiantada, encarregando-se D. Diogo de Menezes de a defender, nomeando-se para o efeito Manuel Godinho Castelo Branco como governador do forte. Contudo, como o forte ainda não se encontrava concluído, foi considerado inútil, por ser demasiado pequeno para bater as zonas de cota mais baixa à volta do padastro.

A 1 de março de 1642, iniciou-se no outeiro de Santa Luzia a construção de um “forte real”, ou seja, em que a linha de defesa tivesse o alcance eficaz do tiro de mosquete (cerca de 220 metros), com projeto do engenheiro Jeronymo Rozetti, e que origina alguma polémica. À volta da obra construiu-se um muro para evitar o seu bombardeamento. Charles Lassart (-1643), engenheiro-mor do reino, visita o local e manifesta discordância com o projeto adotado, considerando-o irregular e de geometria desadequada.

Ainda em 1642, o governador lançou imposto de $002 sobre os moradores da cidade para as obras de defesa e, a 22 de junho, a câmara decide elevar o imposto do real de água para custeamento das despesas com as fortificações, considerando a necessidade de se repararem e fortificarem os muros.

Porém, todos os arranjos e acrescentos nas muralhas medievais da cidade se mostraram insuficientes perante as novas exigências defensivas, pelo que, no início do ano seguinte, chega a Elvas Jan Ciermans, mais conhecido em Portugal como João Paschasio Cosmander (1602-1648), para superintender as obras da fortificação moderna, que se decide construir. Com ele vêm também o tenente general Rui Correia Lucas e cem pedreiros. Pouco depois são chamados outros engenheiros militares, como Philipe Guitau, João Ballesteros e Jean Gilot (-1657).

Cosmander desenha e dirige a construção da nova fortaleza de Elvas que, grosso modo, segue o perímetro da muralha fernandina, adaptando-se à grande irregularidade do terreno e aproveitando os seus materiais, numa tentativa de redução de despesas.

Simultaneamente, sob ordem do rei, integrou uma junta, composta ainda por João Ballesteros, Lassart e Rozetti, subordinada ao Conselho de Guerra, para estudar o melhor traçado da fortificação do outeiro de Santa Luzia, mas essa continuou parada por desacordo entre os engenheiros. Concedeu-se a Cosmander e a Jean Gilot o poder decisório sobre o projeto, acabando por se adotar uma “fortificação externa”, ou seja, mais pequena do que o pretendido “forte real”, embora com a mesma potência e a face virada à vila, passível de fácil destruição, caso fosse ocupada pelo inimigo. A 1 de abril de 1643, realiza-se a cerimónia de lançamento e bênção da primeira pedra do novo forte, presidida pelo bispo D. Manuel da Cunha (1594-1658), com a presença do governador general Martim Afonso de Melo, dos mestres de campo D. João da Costa (1610-1664), D. João de Sousa e outros "ministros da milicia", da nobreza e do povo da cidade. Rui Correia Lucas imprime grande dinâmica às obras do forte, que irá integrar a antiga capela, alterando-se, contudo, o acesso ao interior, que deixa de ser axial, para passar a fazer-se por uma fachada lateral.

O primeiro cerco a Elvas, durante as Guerras da Aclamação (1640-1668), ocorreu em novembro de 1644, sob o comando do general Torrecusa. Ainda que inacabado, o forte no outeiro de Santa Luzia já se encontrava em estado de defesa, batendo com a sua artilharia o reduto montado pelo inimigo no outeiro do Casarão. E, apesar da fortificação moderna estar apenas no princípio da sua construção, segundo o conde da Ericeira, Torrecusa é forçado a retirar, oito dias depois, devido à defesa do conde de Alegrete. Durante o cerco, estava em Elvas o engenheiro António Rodrigues, que é encarregue das estradas cobertas e, pouco depois de os espanhóis retirarem, fez-se a ligação entre a praça e o Forte de Santa Luzia por caminho coberto, sob a responsabilidade de Diogo Gomes de Figueiredo.

Cosmander continuou a direção das obras da praça durante mais alguns anos, já que, em 1646, Pedro Fernandes, quartanário da Sé de Elvas e conhecedor da arte da fortificação, foi nomeado para o ajudar.

Em 1648, as obras do Forte de Santa Luzia foram concluídas, conforme atesta a data inscrita na lápide sobre o portal, e o facto de Nicolau de Langres escrever ao rei, a 12 de julho, dizendo ter servido há perto de um ano na continuação das obras de fortificação de Santa Luzia e Campo maior, com toda a satisfação, e solicitando o cargo de tenente de mestre de campo general, com o mesmo soldo do mestre João Gillot, o que foi atendido. No mesmo ano, Langres projetou a obra coroa no outeiro do Casarão, a qual foi considera por Martim Afonso de Mello, em carta ao rei, de 15 de julho, de grande importância para a segurança da praça, pois sem ela, o local seria um grande padastro para a praça. A obra coroa teve início em 1650 e foi concluída em 1653.

Considerado como uma “fortificação externa” da praça, o Conselho de Guerra mudará várias vezes de opinião quanto à necessidade do Forte de Santa Luzia ter um governador independente. Por exemplo, Martim Afonso de Melo acha que o forte não precisa de governador, por considerar a cidade e o forte como uma única fortificação e estarem ligados por caminho coberto. A 2 de abril de 1649, o Conselho de Guerra nomeou, como governador do forte, o sargento-mor João de Amorim. Contudo, quando este abandona o cargo, em 1655, o Conselho de Guerra considerou que bastaria apenas um governador para a cidade e para o forte. Dois anos depois, o mesmo conselho voltou a mudar de opinião e a nomear um governador independente para Santa Luzia. Por fim, em 1805, passou a ser considerado como bateria da praça, extinguindo-se o cargo de governador.

Entre o mês de outubro de 1658 e janeiro de 1659, D. Luís de Haro (1598-1661), com um exército de mais de 15 000 homens, cercou Elvas e ocupou as colinas do Convento de São Francisco e de Nossa Senhora da Graça, construindo na última uma fortificação de campanha, onde instalou duas peças de artilharia. Segundo Luís Serrão Pimentel (1613-1679), durante o cerco e devido às más fundações da muralha, a cortina de São Vicente (…) se abrio, & arruinou, & tambem por baixo da porta da Esquina, onde cahio (...) hum grande lanço com o laborar de huas Peças que allí plantei (…) (Pimentel, 1993, p.108). O engenheiro António Rodrigues (…) fasendo por sua defença hua brecha e assistir athe se acabar com sua estacada e parapeito fazendo accomodar a pólvora e mais petrechos de fogo em vários logares aonde se levava dos armasens por entre os riscos das bombas do inimigo (...) (Sepúlveda, 1919, p. 459). A 14 de janeiro de 1659, o marquês de Marialva, com o seu exército de socorro, venceu os espanhóis, na vitória das Linhas de Elvas.

Por esta data, o perímetro da fortificação de Elvas já estava fechado. No entanto, documentação de 1661 e de 1662 referem a necessidade de se lhe acudir, certamente devido aos danos causados no cerco, sendo algumas obras nas muralhas da autoria de Luís Serrão Pimentel.

AS FORTIFICAÇÕES DO SÉCULO XVIII

Em meados do século XVIII, Portugal vê-se envolvido na denominada Guerra dos Sete Anos (1756-1762), devido à sua aliança política com Inglaterra, já que os conflitos opunham a França, a monarquia de Habsburgo e os seus aliados à Inglaterra, a Portugal, ao Reino da Prússia e ao de Hanôver.

Perante a ameaça das tropas francesas e espanholas, na sequência do Pacto de Família, o primeiro-ministro, Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), sob proposta do rei de Inglaterra, convidou Friedrich Wilhelm Ernst Von Schaumburg-Lippe, mais conhecido no território nacional como Guilherme Schaumburg-Lippe ou conde de Lippe (1724-1777), a organizar o exército português e a comandar as tropas luso-britânicas. O conde de Lippe aceitou o convite, chegando a Portugal em junho de 1762. No ano seguinte, foi encarregado de inspecionar as fortificações do reino sugerindo para Elvas, uma das principais entradas naturais do país, a construção de uma fortificação no Monte da Graça, onde já em 1659, os espanhóis haviam construído uma fortificação de campanha para bater o vale. Nesta data, devido ao avanço da artilharia e ao alcance eficaz de um canhão ter passado para os 800 metros, com uma cadência de dois tiros por minuto, permitindo atingir a cidade com alguma eficácia, devido ao desnível do terreno, tornava-se premente fortificar aquele padastro.

A 5 de abril, o marquês de Pombal escreveu ao conde de Lippe a informar que o rei aprovara o seu projeto do forte para o Monte da Graça. Grosso modo, consistia num recinto magistral com quatro baluartes pentagonais interligados por cortinas, formando um quadrado, envolvido por várias obras exteriores: quatro revelins a flanquear as cortinas e um hornaveque na frente norte, a mais vulnerável, e uma linha de muralha exterior. No interior do recinto magistral, Lippe desenhou um conjunto de armazéns e paióis encostados à muralha, à semelhança do construído no Forte de Santa Luzia, com uma pequena construção ao centro.

Logo no mês de julho, o tenente-coronel engenheiro Pierre Robert de Bassenond, que superintendia na engenharia militar sob as ordens de Lippe, deu ordem para o início da sua construção, sob a direção do engenheiro Étienne. Para a construção tornava-se necessário escavar na rocha, já que o projeto impunha que o edifício fosse parcialmente enterrado, de modo a solucionar o problema da falta de espaço disponível.

Em 1764, o conde de Lippe retirou-se para Alemanha, levando consigo o engenheiro Étienne, mas deixando ao marquês de Pombal uma série de "Observações Militares", com uma lista de ações que deveriam ser executadas para dar continuidade aos trabalhos em Elvas e recomendando para a direção da obra Guilherme Luiz António de Valleré (1727-1796), então coronel de artilharia de Estremoz. O conde de Lippe pede ainda a Valleré que o informe regularmente do prosseguimento das obras, bem como ao marquês de Pombal, o que virá a acontecer. Pelo menos inicialmente, Valleré terá contactado ainda com Étienne, sobretudo para esclarecimentos sobre as minas ali aplicadas ou por aplicar.

Valleré introduziu alterações significativas ao projeto inicial: instalou os paióis e os armazéns nos cantos do espaço interior da magistral, junto aos baluartes; criou um potente reduto central, dotado de armazéns para munições, uma cisterna, com capacidade para aguentar uma guarnição de 6 000 homens durante seis meses, e uma capela, encimado pela casa do governador, capaz de resistir mesmo após a conquista do recinto magistral; alterou o desenho da esplanada, modelando todo o monte; construiu na aresta da esplanada uma espécie de flechas, hoje já não observáveis, mas que serviam de assento a peças de calibre 6; e mandou reconstruir uma pequena fonte, denominada de Nossa Senhora, na encosta do forte, interligando-os por um caminho coberto, passando então a designar-se Fonte do Marechal. Para além disso, inventou um modelo de reparos que permitia fazer tiro mergulhante, outros facilmente desmontáveis e remontáveis para artilharia ligeira e uma nova placa que facilitava o manejo dos morteiros, apenas por três homens.

Quando o conde de Lippe regressou a Portugal, em 1767, por um curto período de seis meses, mostrou-se satisfeito com a obra de Valleré e aprovou as alterações feitas ao projeto inicial, bem como as que ainda estavam por executar. Em reconhecimento, eleva-o a brigadeiro. O próprio rei, D. José I (1714-1777), que visita o forte em 1769, louva o trabalho ali realizado. O forte, até aí conhecido como Forte de Lippe, em homenagem ao seu primeiro mentor e projetista, passou a denominar-se de Forte da Graça, por ordem de D. Maria I (1734-1816), em 1777.

Entre 1777 e 1778, as obras de construção foram interrompidas, mas os trabalhos continuam pouco depois. Normalmente aponta-se o ano de 1792 para o término das obras, todavia, num relatório de 1797, o governador da praça, o tenente general Francisco Noronha, informa que, (…) Quando julgava, pelas informações que me davam, que o Forte da Graça lhe não faltava mais que as plataformas, repastos e algumas miudezas, fui achar as ruínas, somente com as galerias magistrais; e os seus ramais uns sem terem princípio e os outros sem fazerem perceber as ordens que tinham projetado (...) (Bucho, 2013, p. 116). Aponta-se ainda para o facto de, após a morte de Valleré, não haver quem soubesse falar dos projetos, chegando-se a sugerir contactar a viúva para se consultar os documentos do forte e tentar perceber o modo de colocar a artilharia para a sua defesa.

A obra chegou a envolver cerca de seiscentos homens por dia, alcançando um total de 32 000 homens e 4 000 animais. Deste contingente, cerca de 1 500 homens limitavam-se a transportar água da Fonte do Marechal para o estaleiro da obra, cujo total é orçado em 769:199$039 reais. Desde o início que a obra causa admiração em todos os que a visitam. Entre esses, conta-se Christian, príncipe de Waldeck (1744-1798), coadjutor do marechal-general duque de Lafões (1719-1806), que, em 1798, refere: (…) O forte continua a ser uma obra-prima de fortificação, cuja arte se esgotou aqui completamente (...) As casamatas, minas, capela, cisternas, alojamento do comandante, casas da guarda, tudo é notável (...). Nota: E tudo está muito bem organizado (…) (Bucho, 2008, p. 63).

Durante o século XVIII, realizaram-setambém algumas obras de reforço na fortaleza da praça. Por exemplo, em 1713 foi aberta a poterna de São Francisco. Por volta de 1757, o engenheiro Miguel Luiz Jacob (c. 1710-1771) desenhou algumas obras projetadas para melhorar a defesa da cisterna, documentou a existência de um único cavaleiro, no baluarte de São João de Deus, e a obra coroa com a gola defendida por uma única tenalha, disposta a norte. Tal revela que os cavaleiros dos baluartes da Praça de Armas e do Casarão, e a tenalha sul da obra coroa foram construídos entre 1757 e 1802, data da planta delineada por Francisco D’Alincourt (1733-1816), onde são representados. O cavaleiro do baluarte do Casarão será contemporâneo da edificação do Quartel do Casarão, com construção iniciada em 1767, por ordem do conde de Lippe e com projeto ou direção do coronel Guilherme Louiz António de Valleré.

Quanto às obras para melhorar a defesa da cisterna e o troço final do aqueduto, elas terão ocorrido entre 1797 e 1802, data em que também são representadas em planta. Isto porque, foi em 1797 que o Real Corpo de Engenheiros propôs, por questões defensivas, que o seu término passasse a fazer-se sob o fosso e que se construísse, na face sul do redente do Cascalho, duas casamatas, comunicando com as casernas ali existentes, (…) para defender o fosso do revelim, visto que o fogo superior fica muito mergulhante (…) (Bucho, 2013, p. 69).

Segundo a correspondência entre o governador da Praça de Elvas, o tenente-general Francisco Xavier de Noronha, e o marechal-general duque de Lafões, D. João Carlos de Bragança e Ligne de Sousa Tavares Mascarenhas da Silva, datada de 1797, verifica-se que ainda se deu início a duas pequenas fortificações para colmatar algumas deficiências do Forte de Santa Luzia, mas entretanto, as obras são abandonadas. De facto, (…) não tendo o Forte de S.ta Luzia esplanada nem obras q[ue] prometão duração na Rezistencia, se julgou essencialmente preciso fazer-se hum Reduto em huma pequena altura chamada de S. Mamede (...). Justamente se imaginou outro Reduto no Fortim chamado de S. Pedro (…) (Bucho, 2013, p. 130). No entanto, quando os fortes já tinham (...) as canhoneiras construhidas, e o fosso, e mais Obra no maior adiantamento (…) (idem, ibidem, p. 132), o segundo duque de Lafões, mandou parar as obras, para grande desagrado do governador da praça.

AS FORTIFICAÇÕES DO SÉCULOS XIX

Em 1806, Napoleão decretou um Bloqueio Continental a Inglaterra, a que Portugal se recusou a aderir e, em agosto do ano seguinte, França ultimou o governo português a declarar guerra a Inglaterra, até ao dia 1 de setembro, ou as suas fronteiras seriam atravessadas por soldados franceses.

Tal viria a ocorrer a 1 de dezembro desse mesmo ano, quando um exército de cerca de 9 500 homens, comandado pelo general Francisco Solano (1768-1808), capitão-general da Andaluzia, entra em Elvas. Apesar do contingente militar na cidade, sob as ordens do governador Pedro José de Almeida Portugal (1754-1813), terceiro marquês de Alorna, o príncipe regente (1767-1826) ordenou que as portas fossem abertas, sendo a praça e o Forte de Santa Luzia tomados e, pouco depois, também o Forte da Graça o foi. No dia 11 de março de 1808, os franceses assumiram o governo da Praça de Elvas, ficando à frente das tropas como governador militar o coronel Michel. Em final de 1808, os franceses saíram da cidade, estabelecendo-se em Elvas uma junta governativa chefiada pelo bispo da cidade, D. José Joaquim da Cunha Azeredo Coutinho (1742-1821).

Em 1810, preparando-se para uma nova invasão francesa, o governador Francisco de Paula Leite (1743-1833) ordenou a demolição de todas as construções e arvoredo até 200 braças da esplanada da praça. No ano seguinte, por ordem do marechal Arthur Wellesley (1769-1852), duque de Wellington, e comandando o exército anglo-luso da fronteira do Alentejo o general Rowland Hill (1772-1842), procedeu-se à construção de quatro pequenos fortes, conhecidos localmente como fortins, sobre pequenas elevações de terreno, nas imediações da praça e do Forte de Santa Luzia, tentando assim colmatar as deficiências do campo entrincheirado sentidas na batalha das Linhas de Elvas.

O Fortim de São Mamede foi construído num outeiro a sudeste do Forte de Santa Luzia que, já em 1641, durante a Guerra da Restauração, constituía um padastro e onde então se demolira a medieval Igreja de São Mamede. A poente, construi-se o Fortim de São Pedro, onde também, por volta de 1641, se demolira a Igreja de São Pedro de Fora, cortara o arvoredo em volta e aplanara o local, para a construção de um pequeno reduto, designado de São Pedro, representado num desenho de João Nunes Tinoco, em 1663. Em ambos os outeiros, iniciaram-se obras de fortificação em 1797, mas depois abandonadas, conforme já considerado.

A poente da praça e nas imediações do Aqueduto da Amoreira, que o inimigo poderia utilizar como obstáculo para avançar no terreno, construiu-se o Forte da Piedade e o de São Francisco, tendo na elevação deste último, já entre 1658 e 1659, os espanhóis colocado as suas baterias para bater a cidade. Aliás, na representação da Batalha das Linhas de Elvas, da autoria do engenheiro Pierre de Saint Colombe, datada sensivelmente de 1661, é desenhada uma fortificação no mesmo local.

Os fortins são construídos segundo as características dos fortes das denominadas Linhas de Defesa de Lisboa, também construídos por ordem do duque de Wellington, e constituíam a primeira linha de defesa de Elvas. Em 1823, segundo informação de Joaquim Jozé de Almeida e Freitas, tenente coronel do Real Corpo de Engenheiros, a sua guarnição de infantaria era de 353 soldados, e ainda eram considerados importantes para a defesa da praça: (…) Estes reductos são p.te destacados da Fortificação desta Praça muito interessantes a boa defensa; por q[ue] estando elles bem reparados e bem fortificados hãode demorar tempo considerável os sitiantes dist.es do Forte de S. Luzia, e da Praça; port.o he de m.ta urg.ia a comcervação destes reductos, como Obras permanentes (...) (Bucho, 2013, p. 130). Contudo, em 1875, segundo o relatório do governador da praça, o general Francisco Xavier Lopes, os fortes estão completamente abandonados. A posterior apropriação particular da entrada de serventia do Forte de São Francisco iria determinar o seu futuro, acabando por ser vendido à Câmara Municipal de Elvas, a 3 de fevereiro de 1920, por 686$85, na sequência do qual foi demolido para ampliação do cemitério.

No âmbito das Guerras Peninsulares (1807-1811), procedeu-se também a algumas obras de reforço na praça e no Forte de Santa Luzia. Na fortaleza foram construídas as canhoneiras acasamatadas em alguns baluartes, conservando-se ainda as do baluarte da Conceição e uma no cavaleiro do Casarão, os espaldões e as meias luas no baluarte de São Domingos. Durante a mesma centúria, foram construídas as latrinas geminadas, sobre os parapeitos, tipo guaritas, com escoamento direto dos dejetos para o fosso.

No Forte de Santa Luzia, procedeu-se à construção, possivelmente no início do século XIX, à volta do caminho coberto tenalhado, das trincheiras e das covas de lobo, das galerias sob o reparo, barbetas e traveses sobre o terrapleno e das casernas a sul do fosso. Em 1811, construíram-se ainda dois traveses e sete espaldões, passando os que fecham as golas dos baluartes a ter uma canhoneira abobadada.

Em conclusão, pode afirmar-se que, com a construção dos quatro pequenos fortes, encerra-se o ciclo construtivo de arquitetura militar da cidade, ampliando o perímetro fortificado de Elvas para cerca de 10 quilómetros, fazendo com que esta seja a cidade portuguesa com o maior e o mais excecional conjunto de fortificações modernas construídas e o maior conjunto de fortificações abaluartadas terrestres, de fosso seco, no mundo, que ainda subsiste. Mas Elvas destaca-se ainda pelo grande número de equipamento militar, construído no interior da praça-forte, para suporte e sustentação do grande contingente militar, tornando-a numa verdadeira cidade-quartel, cujo papel manteve até 2006, ano da saída do último regimento.

Paula Noé 2018

Para saber mais sobre o equipamento militar de Elvas, consulte neste site o seguinte Inventário Temático: NOÉ, Paula – Elvas – “Cidade-Quartel Fronteiriça”. Lisboa: DGPC/SIPA, 2018.

BIBLIOGRAFIA

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PRAZERES, Tiago Miguel Castanho – O Forte de Nossa Senhora da Graça. Arte e Regra do Desenho. Dissertação de Mestrado em Arquitectura apresentada à Faculdade de Arquitectura da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Coimbra: julho 2016, texto policopiado.

RODRIGUES, Jorge e PEREIRA, Mário – Elvas. Lisboa: Editorial Presença, 1996.

SEPULVEDA, Christovam Ayres de Magalhães - História Orgânica e Política do Exército Português. Provas. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1919, vol. VIII, pp. 458-460.

Tipologia

Arquitetura militar

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