Paço dos Comendadores da Ega / Paço da Ordem de Cristo

IPA.00002803
Portugal, Coimbra, Condeixa-a-Nova, Ega
 
Paço dos comendadores da Ordem de Cristo, construído no séc. 14 / 15, sobre as estruturas de uma fortificação edificada no séc. 12, pela Ordem do Templo, reaproveitando pré-existências islâmicas, e reformado no séc. 16. Ega inseria-se no termo de Soure, importante zona de fronteira entre o território cristão e muçulmano, que contribuiu para a defesa da cidade de Coimbra, doado à Ordem do Templo, em 1128, a qual aqui construiu um castelo, reaproveitando estruturas islâmicas que, segundo Ana Lima Revez, podem recuar ao séc. 9. De facto, as obras de recuperação do paço puseram a descoberto, para além de um conjunto bastante significativo de fragmentos de cerâmica islâmica, maioritariamente do período califal (sécs. 10 - 11), vestígios de fundamentos nas fachadas norte, sul e nascente, que podem ser desse período e parecem ter servido de base a todas as construções e remodelações futuras; na fachada nascente, pôs-se a descoberto um aparelho murário construído com uma técnica tipicamente omíada, em que esse é ordenado na horizontal e na vertical em fiadas de pedra de grande dimensão intercaladas com fiadas de pedra miúda, seguida de um aparelho constituído pelos mesmos blocos e pedras facetadas, mas de menor dimensão também do período islâmico, embora posterior. Ainda que reaproveitando estruturas mais antigas, o paço dos comendadores resulta da reconstrução do castelo templário, possivelmente no séc. 14 e 15, numa época em que, já não possuindo importância estratégica, se procurou dotá-lo de maior conforto e comodidade. Caracteriza-se pela planta em U invertido, com a ala nascente mais estreita, desenvolvido à volta de um pátio, fechado por muro, que alguns autores consideram uma persistência muçulmana, com estrutura simples e funcional, e fachadas de grande sobriedade. No cunhal sudeste existem silhares em espera, revelando o prolongamento da ala para sul, mesmo ao nível das fundações. As fachadas, de dois pisos, o primeiro de apoio a atividades agrícolas e o segundo essencialmente de habitação, apresentam o piso térreo de maior espessura, exterior e interiormente, não só, talvez devido ao aproveitamento de paramentos mais antigos, mas também ao aligeiramento dos muros numa segunda fase construtiva, mais concretamente no séc. 15, época em que se deve ter acrescentado o piso superior. A visitação de 1508 encontra o paço com algumas dependências derribadas, mas descreve-o com uma estrutura semelhante à que chegou até ao séc. 20, fechado sobre si próprio, com um portal de acesso, e composto por nove casas sobradadas sobre outras tantas no primeiro piso, ou seja, com a divisão espacial igual entre os dois pisos, e com três casas térreas, correspondentes ao celeiro e duas estrebarias, desconhecendo-se a localização exata destas últimas. Por ordem dos visitadores, o paço foi reformado pelo comendador D. Fernando de Sousa, resultante no regularização e alteamento de algumas dependências, conservação de pavimentos, coberturas, substituição de algumas divisórias de madeira por tijolo, arranjo de dependências agrícolas e, mais significativo, a abertura de novas janelas e portais, que conferiram maior funcionalidade e luminosidade interior. Todos estes novos vãos são executados em estilo manuelino, com jambas biseladas e arcos em carena, com decoração fitomórfica distinta, à exceção de um da fachada nascente, que é mainelado, com arcos de volta perfeita sobre colunelo helicoidal. Estas obras são atribuídas ao arquiteto Marcos Pires (CONCEIÇÃO, A. 1983, p. 203), que também trabalhou na Igreja Paroquial de Ega, no convento de Santa Cruz de Coimbra (v. IPA.00004234) e nos Paços da Universidade de Coimbra (v. IPA.00002716). As duas mísulas antropomórficas, do séc. 15 / 16, dispostas no pátio, em posição confrontante e à mesma cota do pavimento, uma na ala central e outra no muro do pátio, possivelmente serviam de apoio a antigo alpendre desenvolvido ao longo da ala nascente. No séc. 17, o paço e a respetiva propriedade foram integrados na Casa do Infantado e, a partir do final do séc. 18, entram num período de declínio, abandono e utilizações descaracterizantes. Apesar das obras recentes de adaptação a turismo de habitação terem introduzido algumas alterações espaciais e de fenestração, sobretudo no piso térreo, devido às novas exigências habitacionais e turísticas, as mesmas procuram respeitar a estrutura do edifício e as molduras dos vãos, ainda que propositadamente distintas, harmonizam-se com as manuelinas.
Número IPA Antigo: PT020604060012
 
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Registo

 
Edifício e estrutura  Edifício  Residencial unifamiliar  Casa de função  Casa do comendador  

Descrição

Planta em U invertido, desenvolvido à volta de um pátio, fechado, formando quadrilátero. Volumes articulados com coberturas em telhados de três águas, rematadas em beirada simples e sobrepostas por quatro chaminés. Fachadas em alvenaria de pedra aparente, revelando pela estereometria algumas vicissitudes e alterações, com cunhais em cantaria de calcário, e evoluindo em dois pisos, o primeiro de maior espessura, exterior e interiormente. A fachada principal surge virada a sul, com três panos, o central formado pelo muro que fecha o pátio, ligeiramente recuado e mais baixo, rasgado ao centro por portal de acesso ao interior, moldurado e em arco apontado; no extremo direito, o pano é mais alto e revela grandes alterações no aparelho. Os panos laterais, correspondentes aos topos das alas do U, são rasgados, ao nível do segundo piso, por uma janela de peitoril, de verga abatida (esquerda) ou retilínea (direita). O cunhal da ala direita possui silhares em espera. A fachada lateral esquerda, virada à igreja e à povoação, é rasgada, no piso térreo, por janela jacente e por porta, de verga reta moldurada, de feitura recente, e, no segundo piso, por quatro janelas de peitoril, retilíneas, de moldura recente, a formar pano de peito em cantaria; entre dois vãos surge a marcação de uma outra janela retilínea pré-existente, atualmente fechada. A fachada lateral direita, com a ala sensivelmente mais baixa, é rasgada, no piso térreo, por seis janelas jacentes gradeadas, tendo sensivelmente a meio, vestígios de um portal, atualmente entaipado. No piso superior abrem-se janelas a ritmo irregular e diferente modinatura e decoração, sendo seis de peitoril e uma de sacada. A do extremo esquerdo possui moldura recente, a segunda, disposta junto a um antigo cunhal de cantaria, tem arco canopial decorado com duas flores, a terceira possui arco abatido, com pano de peito em cantaria, seguindo-se janela retilínea de moldura simples e uma outra com arco em carena, rematado em botões e pano de peito em cantaria; as duas abertas no corpo alteado, possuem arco abatido, sendo a última de sacada, com guarda em ferro. Na fachada posterior abrem-se, no piso térreo, duas janelas de peitoril retilíneas, de moldura recente e gradeadas, dispostas nos topos, e janela jacente sensivelmente ao centro. No segundo piso rasgam-se quatro janelas de peitoril, três com falso pano de peito em cantaria, tendo duas arco em carena, de diferentes modinaturas e motivos vegetalistas distintos, e uma outra mainelada, com colunelo de fuste helicoidal e anel central a sustentar duplo arco de volta perfeita; a do extremo direito é retilínea e de moldura recente. O pátio central, com pavimento em paralelos, é delimitado pelas três alas e pelo pano de muro, com ressalvo em quase toda a sua extensão superior; perto da ala nascente tem mísula antropomórfica. A ala esquerda é rasgada nos dois pisos por vãos retilíneos, de molduras recentes, correspondendo a portas no piso térreo e a janelas de peitoril no superior, sendo uma delas quadrangular; no térreo abre-se ainda amplo vão de verga reta sobre impostas. Junto deste, desenvolve-se escada de cantaria, com guarda plena, de acesso ao segundo piso, onde forma patamar protegido por alpendre telhado, assente em pilar sobre a guarda; sob o alpendre abre-se porta de verga reta simples e, na ala frontal, uma outra, mas com moldura ornada de carenas. Sob o patamar da escada, abre-se porta. Na ala central, virada a sul, abrem-se dois portais, o da esquerda mais largo, e duas janelas de peitoril; junto ao portal direito existe mísula antropomórfica confrontante com a do pano de muro. Na ala direita abrem-se, no piso térreo, quatro portais de verga reta, dois deles com a moldura a formar carena, encimados por pequeno vão quadrangular (esquerda) e janelas de varandim, um deles também com carena e com guarda em ferro. Sensivelmente ao centro, desenvolve-se escada para o andar superior, com guarda plena e patim coberto por alpendre telhado, assente em pilares sobre a guarda, protegendo portal de verga reta. INTERIOR: com as paredes em alvenaria de pedra aparente. No segundo piso, tem pavimento em soalho de madeira e tetos em gamela, com apainelados de madeira, sobre friso do mesmo material. As várias salas neste andar comunicam entre si por portas de verga reta e possuem janelas conversadeiras. Na ala poente, destaca-se a ampla sala, com escada de comunicação ao piso inferior, e chaminé disposta a poente, assente em pilares. Um portal de arco em carena e jambas biseladas, estabelece a comunicação entre esta sala e do topo da ala, que possui lareira na parede poente.

Acessos

Ega, Casal da Vila; EN 342 (Condeixa-a-Nova / Soure) Km. 4; EM 607. WGS84 (graus decimais): lat.: 40.0957489; long.: -8.5371389

Protecção

Categoria: IIP - Imóvel de Interesse Público, Decreto n.º 5/2002, DR, 1ª série-B, n.º 42 de 19 fevereiro 2002 / Incluído na Zona de Proteção da Igreja Paroquial de Ega (v. IPA.00002799)

Enquadramento

Urbano, isolado, no alto de uma colina sobranceira ao rio Mouro, que a ladeia na sua vertente norte e nordeste, e à vila, de onde se desfruta amplo panorama sobre a região, em especial para nascente e para norte. O paço, que se destaca da envolvente, insere-se numa propriedade, que compreende uma mata de carvalhos seculares, pinheiros, oliveiras e outras espécies. Do portão da quinta, desenvolve-se caminho até ao terreiro fronteiro à fachada principal. A Igreja Paroquial ergue-se a poente, numa cota inferior.

Descrição Complementar

O paço possui dez quartos, com aquecimento central, internet, casa de banho privativa, oito salas (a maior com 140 m2), incluindo sala de jantar, sala de estar, sala de leitura, sala de snoocker e sala de televisão. Numa das janelas do paço existem reaproveitados três fragmentos de inscrições funerárias romanas, de calcário local, possivelmente provenientes da vizinha cidade de Conimbriga. Uma surge no avental da janela, cujo reaproveitamento implicou a colocação de um banco de pedra de través, que destruiu parte do texto. Tem de dimensões 145 x 52,5 x 23 e a inscrição, com recurso a linhas de pauta singelas ainda visíveis, reza: "AVITO (hedera) CA[E]NO/NIS (hedera) F(ilio) (hedera) SV[N]VA / TANGIN[I (hedera) F(ilia)] / MATER / (hedera) F(aciendum) (hedera) [C(uravit) (hedera)]. A sua tradução é: "A Avito, filho de Cenão, Súnua, filha de Tangino, a mãe, mandou fazer". Segundo José d'Encarnação e Virgílio Correia, pela paleografia, pelo modo de identificação das personagens e pela simplicidade textual, a inscrição deve datar da primeira metade do séc. I da nossa era. Uma lápide outra surge reaproveitada como verga da janela, colocação que implicou um recorte em arco de círculo, correspondente à luz superior da janela, e que destruiu a parte inicial da maioria das linhas do texto. Mede 149 x 56 cm e tem a seguinte inscrição: "D(iis) M(anibus) / [I]VLIO FORTVNATO / [A]NN(orum) XXVIII (duodetriginta) / [RO]MAE SEPVLTO / [CLAV]DIA VITALIS / MATER / [IVL]IA SOROR". A sua tradução é "Aos deuses Manes. A Júlio Fortunato, de 28 anos, sepultado em Roma - Cláudia Vital, a mãe; Júlia, a irmã". A terceira lápide surge reaproveitada como verga de uma porta interior, o que deve ter dividido o bloco original em várias fatias, de que se conserva apenas esta, contend a parte inicial das linhas do texto. Segundo José d'Encarnação e Virgílio Correia, pela espessura conservada, pela (verosímil) presença original de moldura (um meio-redondo côncavo) e pela invulgar extensão do texto, a epígrafe deverá inserir-se no âmbito dos cipos simultaneamente funerários e honoríficos, ainda que encostado ou mesmo embutido num elemento arquitetónico. A lápide mede 124 x (21) x 41 e tem a inscrição: "D(iis) [M(anibus)] / M(arco) L(ucanio vel Lucceio?] [FLA] / VINO [...] / REN [...] [OM] / NIBV[S HONO] / RIBV[S MVN(icipii) ?] / CO[NIMBRI?] / GEN[SI vel SIS vel S(ibus)?] [HO?] / NORI[BVS] / PERFV[NCTO] / M(arcus) V(alerius?) [...] / AMIC[O] [OP] / TIME [sic] [...?] / F(aciendum) [C(uravit)] / H(ic) · S(itus) [E(st)] [S(it) (ibi) / T(erra) L(evis)] [?]". A sul do paço existe ainda piscina.

Utilização Inicial

Residencial: casa do comendador

Utilização Actual

Comercial e turística: casa de turismo de habitação

Propriedade

Privada: pessoa singular

Afectação

Sem afetação

Época Construção

Séc. 14 / 15 / 16 / 20

Arquitecto / Construtor / Autor

ARQUEÓLOGA: Ana Lima Revez (2007-2009). ARQUITETOS: Marcos Pires (séc. 16 - atribuído), Miguel Brito Correia (2007-2009).

Cronologia

1064 - conquista definitiva de Coimbra por Fernando Magno; 1116 - investida almorávida fustiga o território de Soure e Ega; 1128 - D. Teresa, viúva do conde de Borgonha, doa à Ordem do Templo o castelo de Soure e os territórios circundantes de Ega, Redinha e Pombal, com a condição de neles construírem fortificações e igrejas; 1145 - Rui de Azevedo documenta a existência dos Templários em Ega, recebendo heranças e terras cultivadas; 1183 - 1185 - na Inquirição realizada na cidade de Coimbra, o presbítero Cipriano revela que se recordava do povoamento de Ega, Redinha e Pombal e que essas terras teriam sido ganhas oito anos depois da reconquista de Santarém e Lisboa (1147), que elas haviam sido tiradas aos mouros pelos Templários e que, quando os Templários as obtiveram, já uma quarta parte de Ega era cultivada, mas as demais estavam incultas ainda que nos seus confins trabalhassem alguns homens de Soure algumas leiras; a igreja havia sido construída na década de 40; 1186, 29 janeiro - o papa Urbano III por bula Intelleximus ex autentico dirigida ao mestre e cavaleiros da Ordem do Templo, confirma as igrejas de Ega, Pombal e Redinha, construídas pela Ordem, e toma-as sob a proteção da Santa Sé; séc. 12 - época provável da construção do castelo de Ega na zona mais alta do lugar; 1231, 01 setembro - frei Estevam de Belmonte, 11º mestre da Ordem do Templo, concede foral a Ega, sendo então seu comendador frei Gonçalo Gonçalves; 1248, 30 agosto - constituição da comenda de Ega, da Ordem do Templo; 1307, 12 agosto - o papa Clemente V, pela bula "Regnans in ecclesis triumphans", dirigida a D. Dinis, convida o rei a acompanhar os prelados de Portugal ao Concílio de Viena, onde se procuraria determinar o que fazer da Ordem do Templo e dos seus bens, por causa dos erros e excessos que os seus cavaleiros e comendadores haviam cometido; 18 agosto - sentença atribui a posse das vilas e castelos de Soure, Ega e Redinha a D. Dinis; 1307 - elaboração de carta onde se justifica a tomada de posse das "(...) vilas e castelos de Soury e de Poonbal e sobrela Ega e sobrela Redinha com todos seus termhos e dereytos per raçom que (...) as ditas vilas castelos de Soury e de Poonbal e da Ega e da redinha eram meus [ do rei] e deviam a seer de dereyto e que os ditos maestre e freires tragiam como nom deviam e que como quer que os posuysem per alguu tenpo diziam que os posuyrom e os trouverom per mha sofrença e per meu consentimento [do mesmo rei](...)"; leitura da carta nas vilas de Soure, Pombal, Ega e Redinha por um procurador do rei; 23 junho - sentença determina que as vilas fossem entregues ao porteiro do rei que, por sua vez, as entregaria para Pero Martins de "cryaçom do rei"; a leitura da carta é acompanhada do confisco dos bens; "A qual carta lida e pubricada o dito Joham d'Amarante porteyro do nosso senhor elrey pediu a Martinho Anes Almoxarife da Ega que lhy entregase a dita Ega em Logo de revelya pera el rey com todos seus dereytos e perteenças com mais e milhos sempre ouvera e de dereyto devia aaver. E o dito Martinho Anes Almoxarife da dita Ega fez entrega ao dito Joham dAmarante porteyro de nosso senhor elrey a dita Ega como todos seus termhos e pertenenças e dereytos (...) E logo prezente a essa ora o dito Joham d'Amarante porteyro de nosso senhor el rey recebeu a dita Ega e pro el rey e em nome Del rey em seu logo (...) fez entrega e entregou a Pero Martiinz da cryaçom de nosso senhor el rey (...)"; 30 junho - carta de posse pela qual D. Dinis tomara as vilas e castelos de Ega, Redinha e Soure, que lhe foram julgadas por sentença; 1309, 27 novembro - sentença judicial definitiva a favor do rei contra a Ordem do Templo, pela qual se diz pertencer ao rei a vila e o castelo de Soure, com seus termos e Pombal, Ega e Redinha; 1312, 22 março - extinção da Ordem do Tempo, pela bula "Vox clamantis"; 02 maio - bula "Ad Provirem" concede aos soberanos a posse interina dos bens da Ordem do Templo, até o conselho decidir o que fazer com eles; 1319, 14 março - bula "Ad ea ex quibus" de João XXII institui a Ordem de Cavalaria de Jesus Cristo, ou a Ordem de Cristo, para quem passam todos os bens e pertenças da Ordem do Templo: "outorgamos e doamos e ajuntamos e encorporamos e anexamos para todo o sempre, à dita Ordem de Jesus Cristo (...), Castelo Branco, Longroiva, Tomar, Almourol e todos os outros castelos, fortalezas e todos os outros bens, móveis e de raiz"; 1321, 11 junho - divisão em 38 comendas da Ordem de Cristo dos antigos bens pertencentes aos Templários, mantendo Ega a sua função de cabeça da comenda e de residência do comendador; 1449, 07 março - o Infante D. Pedro, 1º duque de Coimbra, no seu percurso para Alfarrobeira acampa com o seu exército em Ega, seguindo no dia seguinte para a vila da Batalha; séc. 14 / 15 - época provável da construção do paço dos comendadores sobre o antigo castelo templário; a comenda de Ega terá custeado a maior parte da despesa da armada de Vasco da Gama, na descoberta do caminho marítimo para a Índia; 1508, 26 fevereiro - visitação dos bens da comenda-mor de Ega, da Ordem de Cristo, por D. João Pereira e pelo escrivão frei Francisco Estêvão, sendo comendador D. frei Fernando de Sousa, também comendador da vila de Dornes, anexa da dita comenda-mor *1; encontrando o paço com alguma ruína, os visitadores mandam executar as seguintes obras: na sala poente refazer uma parede, construir uma chaminé, à distancia de uma vara do canto da camara contigua, fazer duas janelas com portadas, abrir um portal de acesso que deveria ser encimado por alpendre pequeno, altear a sala, soalhar, madeirar e telhá-la; abrir um portal de ligação com a camara contígua, onde se deveria recuperar o soalho e o teto de madeira, derrubar a má chaminé que tem e fazer uma de novo, e colocar portas novas na janela; nas demais salas devia-se proceder à beneficiação do pavimento e cobertura, mas também na casa pequena que se seguia substituir o "repartimento" de madeira por um outro novo, na câmara de leito fazer uma chaminé, na sala "contra o levante" da sala velha substituir o "frontal" de madeira por tijolo, fazer as janelas que bem lhe parecer e abrir um portal para a camara que está derrubada, a qual devia ser alteada; a parede do celeiro, derrubada, devia ser corrigida, a cozinha devia ser limpa para nela se poder comer, as estrebarias corrigidas e receber manjedouras bem feitas e o lagar, que está derrubado, devia ser feito de novo e coberto de telha; o portal principal e restantes portais e janelas deveriam ser dotados de boas portadas e fechaduras, de acordo com os vãos; para as obras na igreja e no paço devia-se recorrer aos sequestrados 50.000 reais que estão na mão de Gil Alvarez, morador em Condeixa-a-Velha e rendeiro do comendador-mor; não chegando, devia o almoxarife do comendador, Simão Dias tomar das rendas do dito comendador-mor do ano vindouro para a feitura das obras com muita perfeição, sob pena de tudo se fazer à custa do dito almoxarife por seus bens e fazenda e ainda pagar outros 20 cruzados ao convento de Cristo; as obras de remodelação são normalmente atribuídas ao arquiteto Marco Pires; 06 março - data do Tombo da comenda de Ega, comenda-mor da Ordem, que mandara fazer frei D João Pereira do conselho de el rei e o bacharel frei Diogo do Rego *2; o paço é descrito como sendo cerrado sobre si, servido por um só portal, sendo composto por nove casas sobradadas (uma sala grande e outra onde comem os homens, três câmaras, uma sala guarda-roupa, outra casa grande e duas de homens), sobre outras tantas casas ou lojas no primeiro piso, e três casas térreas (um celeiro e duas estrebarias); 1514, 25 fevereiro - D. Manuel outorga foral novo a Ega; 1550 - 1557 - pertence ao comendador-mor D. Afonso de Lencastre, embaixador em Roma e mecenas do tríptico existente na capela-mor da Igreja Paroquial, pintado por Diogo de Contreiras (1543); 1595 - livro da visitação de todos os bens, rendas e direitos pertencentes à comenda de Ega, feita por Pedro de Sousa, continuando a referir-se a existência de nove casas sobradadas *3; 1600 - a comenda de Ega paga 1.800$000, revertendo 3/4 para a Ordem de Cristo e o restante para a Coroa; 1656, 25 maio - a Casa do Infantado recebe as comendas de Ega e Dornes, pertencentes à Ordem de Cristo; 1663, 15 setembro - D. Afonso VI, através de Carta de padrão e doação, confirma todas as mercês até então conferidas à Casa do Infantado; 1693, 02 março - alvará de D. Pedro II confirma a doação da comenda de Ega e Dornes à Casa do Infantado, recebendo também a comenda de Castelo Branco; 1750, 30 setembro - após a morte do Infante D. Francisco, D. José I concede a comenda da Ega a seu irmão D. Pedro, mais tarde rei consorte por casamento com D. Maria I; os rendimentos da comenda contribuem para custear as festas que D. Pedro oferece no Palácio de Queluz; 1755 - o terramoto não causa ruína no edifício, então ao abandono; 1758 - segundo as Memórias Paroquiais, Ega pertence ao bispado de Coimbra e comarca de Leiria, sendo seu comendador o Infante D. Pedro; tem 12 vizinhos e 42 pessoas; o pároco refere que "não he terra murada, nem praça d'armas e só no simo da vila se conservam huas paredes antigas, que ha tradiçam foram de habitaçam do Comendador.. e tem o nome de Paço e hoje para a porta da frente ainda se conserva um quarto em esquina (...)"; 1786 - após a morte de D. Pedro, os bens da comenda de Ega são incorporados na Casa do Infantado; 1793 - o paço e a sua quinta (com cerca de 14.200 m2) são comprados pelo desembargador Dr. João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho, irmão do bispo-conde D. Francisco de Lemos Coutinho; com a morte dos irmãos, o paço passa por herança para a família Lemos, de Condeixa; 1834, 18 março - decreto de D. Pedro IV extingue a Casa do Infantado, sendo os seus bens integrados na Fazenda Nacional; 1836 - extinção do concelho de Ega; 1838 - Ega passa a integrar o concelho de Condeixa-a-Nova; 1895 - venda do paço dos comendadores ao conde Correia Bettencourt; 1914, antes - com a perspetiva da revolução republicana, a quinta é dividida e o paço é vendido ao professor Manuel Falcão e sua mulher, também professora, que ali habitam e instalam duas salas de aula, com frequência mista; 1933, 12 junho - o professor Manuel Falcão é assassinado no paço, na noite de Santo António; 1930, final da década - aí deixa de funcionar a escola; 1941 - escavações arqueológicas junto à fachada lateral esquerda ao paço revelam ossadas talvez de cavaleiros da Ordem do Templo; 1951 - construção de depósito para distribuição domiciliária de água à povoação junto ao edifício; 1974, após - o paço é assaltado e vandalizado; procede-se à instalação de vários serviços de apoio à população, como a Casa do Povo, Serviços Médico Sociais, Farmácia e Associação Cultural e Recreativa, para as quais se realizam algumas obras de adaptação sem critério; 1985, finais - são encontradas reaproveitados numa janela do paço, três fragmentos de inscrições romanas funerárias; 1992 - o PDM de Condeixa-a-Nova inclui ficha do Paço dos Comendadores para esse ser classificado como Valor Concelhio; 1990, década - a Casa do Povo de Ega e Furadouro demonstram interesse pela recuperação do paço; 2007, cerca - aquisição do paço pelos atuais proprietários; 2007 - 2009 - obras de adaptação a turismo de habitação.

Dados Técnicos

Sistema estrutural de paredes portantes.

Materiais

Estrutura em alvenaria de pedra calcária aparente; molduras dos vãos, colunas, pilares e outros elementos em cantaria calcária; grades e guarda em ferro; caixilharia e portas de madeira; vidros simples; pavimento em lajes de cantaria e soalho de madeira; tetos de madeira; cobertura e beirada de telha.

Bibliografia

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DGPC: DGEMN:DSID; CMCN

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DGPC: DGEMN:DSID; SIPA, CMCN

Documentação Administrativa

DGPC: DGEMN:DSID; DGARQ/TT: Livro das Visitações da Ordem de Cristo de 1508, 133, fl 41 e ss; Memórias Paroquiais de 1758, vol. 13, m.º 4, fl 17

Intervenção Realizada

PROPRIETÁRIO: Séc. 20 - construção de coberturas em telha marselha e adaptação dos espaços interiores às novas funções, de habitação e ensino (2 salas de aula) e dos posteriores serviços de caráter público; 2007 / 2008 / 2009 - obras de recuperação do paço de Ega e respetiva adaptação a turismo de habitação, com projeto do arquiteto Miguel Brito Correia, fiscalização da Direção Regional de Cultura do Centro, e com acompanhamento arqueológico de Ana Lima Revez *4.

Observações

*1 - Durante a visitação realizada em fevereiro de 1508, "Virom mais os ditos Visitadores o apousentamento e casas do dito comendador moor (...) e som per todas doze casas. s. noue sobradadas com suas logeas por baixo e trees terreas, e por quanto nom estam tambem repairadas como compre, prouendo sobre isso. mandarom fazer em ellas as obras seguintes. Primeramente mandaraa deribar a parede da salla que estaa contra o ponente tanto quanto for neceessario e tornara a alevantar e mandaraa fazer nella huua chaminee aaquem do canto que estaa contra a camera huua vara de medir. e mandaraa nella fazer duas janelas bem feitas, com suas portas. e aleuantar mais um pouco a dita salla do que ora estaa. e nella huum bom portal bem feito e sobre elle huum alpendre pequeno cuberto de telha e çintado de cal. e mandaraa solhar e madeirar muito bem a dicta sala. e telhar e çintar com cal, e nella outro portal que vaa pera a dicta camera junto do portal per onde a dita camera se serue. e a dicta camara mandaraa forrar de olivel e solhar per onde for neçcessario e derribar ha chaminee que tem mui maa e fazer hi outra de nouo boõa, e poer na janella huuas portas nouas. Tem outra casa pequena que tem huum repartimento de tauoado uelho. mandarlhohaa tirar e fazer de nouo e mandaraa solhar e madeirar de nouo a outra casinha pequena que aalem della estaa. a camera do leito. mandaraa madeirar de novo e forrar de oliuel e telhar e çintar com cal e nella huua chaminee pequena e bemfeita e solhar per onde for neçcessario. a casa que estaa contra o leuante da salla velha. o frontal della que he de tauoado mandaraa fazer de tijollo com as janellas que lhe bem pareçer. e nella huum portal pera a camera que ora estaa derribada a qual casa mandaraa telhar e çintar com cal e faraa levantar a dicta camera de grandura que he, e mandalahaa solhar e madeirar e telhar e çintar com cal a parede de foora que jaz derribada aa maão direita da entrada deste apousentamento mandaraa levantar na altura que dantes era ao menos, e a parede do çeleiro que estaa pera cahir mandaraaa derribar e tornar a correger. E todas as outras casas mandara telhar de guisa que nom chova nelaas e çintar com cal. A casa que serve de cozinha mandaraa muy bem alimpar e correger de maneira que se possa nelle fazer de comer, e as duas casas que servem de estrebarias mandaraa bem correger e fazer nellas booas manjadoiras bem feitas. no portal grande da primeira entrada e asy em todollos outros portaaes e janelas mandaraa fazer portas novas com seus fechos segundo que a cada huum portal e janella pertençem. o lagar que jaz deribado mandaraa fazer de novo e cobrir de telha e aparelhar de todo o que lhe mester fezer. as quaaes obras que asi nas ditas casas ham de seer feitas, se daram todas acabadas em muita perfeiçom dentro de huum ano primeiro seguinte da feitura desta visitaçom". *2 - No livro do Tombo da comenda de Ega, de março de 1508, diz-se que "junto da dicta egreja tem a hordem huu assentamento de casas que sempre foy apousentamento dos comendadores moores. o qual apousentamento he todo çarrado sobre si e se serue per huu soo portal e haa das portas a dentro noue casas sobradadas .s. huua salla grande e outra em que comem os homens e tres cameras e huua guarda rroupa e outra casa grande e duas casas de homems. e huu çeleiro terreo e duas estrebarias. E outras tantas casas terreas debaixo das sobradadas e som todas de huu andar. o qual assentamento estaa em huu teso arredado da villa huu bõom jogo de besta. e por que os ditos visitadores acharom o dito apousentamento per partes danjfjcado. mandarom ao dicto comendador moor que elle o fezesse correger fazendo nelle alguumas obras e asi na sobredita egreja (...). Junto com o dito apousentamento tem a ordem huu çarrado a que chamam o çarrado uelho e começa sse sua demarcaçom no rego do paul e vem entestar nos marmoraaes que estam no camjnho do cadaual e vem teer no dito apousentamento e passa e vay teer ao Rio e uay pello Rio atee as lapas e torna honde se começou (...)".*3 - Na visitação de 1595, refere-se que "(...) a dita ordem tem um assentamento de casas, com seu circuito, que estão junto com a Igreja, todo cerrado sobre si, que todas se servem por uma porta. E está arredado da dita vila um meio tiro de besta. Em que há nove casas sobradadas: scilicet, uma sala principal, e outra em que come a gente, e três câmaras, e uma guarda-roupa, e outra casa grande no começo do dito circuito, e duas outras em que se agasalha gente. E mais um celeiro térreo ladrilhado e duas estrebarias. E outros tantos sótãos das ditas casas sobradadas, que são todas de um andar. E por o dito assentamento estar apartado sobre si e não ter dúvida nem partir com outras nenhumas casas, não foi necessário se fazer mais diligência". *4 - Os trabalhos arqueológicos puseram a descoberto uma base de assentamento mais antiga e mais larga, que parece corresponder à construção primordial da estrutura do castelo, mas poderá relacionar-se também com outras obras de remodelação de uma estrutura pré-existente; o muro de fundação, bem nítido a norte, sul e nascente, parece ter servido de base a todas as construções e remodelações futuras, e remete para uma construção do séc. 10-11, mas encontra-se precedido por níveis de ocupação islâmicos anteriores; na fachada nascente, pôs-se a descoberto um aparelho murário construtivo mais antigo, podendo considerar-se a técnica tipicamente omíada "proto-soga y tizón" (aparelho ordenado na horizontal e na vertical em fiadas de pedra de grande dimensão intercaladas com fiadas de pedra miúda); é seguido, ao nível da base de todo o edifício, de um aparelho constituído pelos mesmos blocos e pedras facetadas mas de menor dimensão, designado de "manpostería de hiladas regularizadas", também do período islâmico, embora posterior, cronologicamente balizado entre os sécs. 10 - 11 e 13; as sondagens no ângulo nordeste do paço puseram a descoberto um muro que prolongava para sul a parede existente ainda visível na fachada sul e constituía-se como a base da fundação do edifício, em pedra calcária com cerca de 85 / 90 cm de largura no topo e cerca de 1,10 m de largo na base da fundação, tendo cerca de 1,86 m de altura máxima preservada; na face interna a base de fundação tem rebordo mais alargado com cerca de 20 cm e na leste existe um talude de argamassa de cal, com um declive acentuado; na área nascente detetou-se a base de dois silos da época Alto Medieval, anulados aquando da construção da estrutura mural, bem como dois fosses em negativo, que se prolongam para nascente; nas escavações não foram detetados nenhuns materiais da época romana, mas apenas fragmentos de construção e cerâmica doméstica de filiação islâmica, reportados maioritariamente ao período califal, do séc. 10 e 11; junto à fachada poente pôs-se a descoberto uma necrópole, que se prolonga pelas zonas não escavadas (norte, sul e poente), tendo-se identificado dois ossários e 8 sepulturas, das quais se exumaram 13 esqueletos completos; todas as sepulturas tinham cobertura bem estruturada e constituída por cerâmicas de construção e lajes calcárias de média e pequena dimensão; as sepulturas, de dimensões reduzidas, retangulares ou ovaladas, estavam maioritariamente orientadas, com a cabeceira para poente e os pés para nascente; o espólio arqueológico nas camadas de revolvimento apontam para enterramentos na Baixa Idade Média, séc. 14 e 15.

Autor e Data

Paula Noé 2016

Actualização

 
 
 
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