Capela de Nossa Senhora do Mileu / Santuário de Nossa Senhora do Mileu

IPA.00001366
Portugal, Guarda, Guarda, Guarda
 
Santuário instituído numa capela de construção românica, que se afirma como ponto importante nos caminhos de peregrinação a Santiago de Compostela. É de pequenas dimensões, de planta retangular composta por nave e capela-mor, com coberturas interiores diferenciadas, de madeira em masseira, executadas no séc. 20, e iluminada escassamente por pequenas frestas e uma rosácea, ainda românica. Revela-se como um exemplar do período de transição do românico para o gótico no arco triunfal, com perfil apontado, sendo o portal axial e o arco triunfal em arcos dobrados, assentes em impostas salientes; as portas travessas assentam em impostas salientes, talhadas nos silhares, encimadas por lintel e falso frontão semicircular. O portal axial possui rosácea simples, com decoração geométrica. A cachorrada ostenta decoração vária, com elementos fitomórficos, animais fantásticos e figuras humanas, que intercalam com pequenas edículas decoradas com elementos vegetalistas; sobre esta, surge um friso de esferas e a cornija. No arco triunfal, os capitéis possuem decoração vegetalista, zoo e antropomórfica, revelando que foram executadas num período tardo-românico, em época de transição. Contudo, este templo teria raízes mais antigas, provavelmente visigóticas, surgindo sobre estruturas de uma villa romana, que se encontra anexa e parcialmente escavada. Na capela-mor, um simples altar em cantaria, novecentista.
Número IPA Antigo: PT020907410007
 
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Registo

 
Edifício e estrutura  Edifício  Religioso  Templo  Capela / Ermida  

Descrição

Planta retangular composta por nave única e capela-mor mais estreita, de volumes articulados e escalonados, com coberturas diferenciadas em telhados de duas águas, rematados em beiradas simples. Fachadas em cantaria de granito aparente, em aparelho isódomo, rematadas por cachorrada e cornijas pontuadas por elementos esféricos. Os cachorros, em número de 34 no lado N. e 33 no oposto, apresentam decoração variada, como meias esferas, cruz de Santo André, cartelas, pirâmides, pássaros, cabeças de lobo, figuras antropomórficas e, entre eles, existem pequenos nichos em arcos quebrados, à exceção das cornijas da cabeceira, onde são decorados com motivos vegetalistas e geométricos, constituindo palmetas, rosetas, trilóbulos e quadrilóbulos, meias-esferas e estrelas. Fachada principal, virada a O., rematada em empena, com cruz grega no vértice, marcada por três mísulas, que poderiam constituir o suporte de um alpendre. É rasgada por portal escavado, em arco dobrado e de volta perfeita, assentes em impostas salientes, o qual tem, no silhar do lado esquerdo a data incisa de "1897" e, no lado oposto, um nicho inciso em arco de volta perfeita, sobrepujado por uma mísula. No topo, rosácea circular, ostentando decoração lobulada. As fachadas laterais são semelhantes, rasgadas por porta travessa de verga reta, assente em impostas talhadas no próprio silhar, a do lado N. encimada por dintel e a oposta por falso frontão semicircular. Possui duas frestas no corpo da nave e um no da capela-mor. Fachada posterior em empena, rasgada por pequena fresta. INTERIOR com paredes em cantaria de granito aparente, teto de madeira em masseira e pavimento em lajeado de granito. Arco triunfal de perfil apontado, dobrado e assente em impostas salientes, com a arquivolta interna suportada por colunas embebidas no muro, com bases circulares assentes em plataformas com ângulos decorados com cabeças humanas, de fuste liso com dois anéis no primeiro terço e capitéis cúbicos, o do lado do Evangelho ornado por motivos vegetalistas estilizados, cabeça humana com gorro e um animal feroz, surgindo, no oposto, motivos vegetalistas, duas aves afrontadas e nos vértices superiores duas cabeças de monstro. No interior da capela-mor, elevada por um degrau, altar em cantaria, com tampa assente em maciço central, surgindo, na parede testeira, três mísulas de cantaria *3.

Acessos

Avenida Cidade de Waterbury

Protecção

Categoria: IIP - Imóvel de Interesse Público, Decreto n.º 37 728, DG, 1.ª série, n.º 04 de 05 janeiro 1950 / ZEP, Portaria, DG, 2.ª série, n.º 221 de 21 setembro 1972

Enquadramento

Urbano, isolado, destacado e situado a N. da cidade da Guarda, numa cota ligeiramente superior à via pública, em zona de ligeiro declive, sobranceira ao Castro dos Castelos Velhos. Encontra-se no centro de um recinto murado a alvenaria seca de granito, com acesso pelo lado O., através de um rasgo no muro; o recinto encontra-se parcialmente relvado e com terra batida, pontuado por algumas árvores, mesas e bancos de cantaria. No lado direito, surge a antiga casa do ermitão e sacristia, envolvida por muro próprio, capeado e rasgado junto à porta principal; tem planta retangular simples e cobertura homogénea em telhado de três águas, com as fachadas em alvenaria de granito aparente, a principal rasgada por dois vãos retilíneos dintelados, o do lado esquerdo correspondente a uma porta e o direito a uma janela de peitoril. No extremo esquerdo, campanário *1, rematado por cornija e por dois pilares, onde se inscreve o cabeção do sino. Fachada lateral esquerda em empena cega, sendo a lateral direita rasgada por duas janelas de peitoril retilíneas, com caixilharias de metal e vidro martelado. No recinto da mesma, surgem várias cantarias artísticas, como fragmentos e bases de colunas, um silhar com inscrição e a data de "1678". Junto a esta, um cruzeiro setecentista, assente em plataforma quadrangular, de três degraus escalonados, composto por plinto paralelepipédico com cornijas na base e no remate, de onde evolui um elemento troncocónico que suporta estrutura hemisférica, com elementos geométricos gravados, por seu turno sobrepujada por elemento troncopiramidal que sustenta a cruz, latina e de hastes trilobuladas. No lado esquerdo do imóvel, cercado por muro de pedra insonsa e capeado, surge o cemitério, que tem no muro O., umas alminhas em cantaria de granito, resultantes, talvez do reaproveitamento de uma sepultura visigótica, com nicho retilíneo, emoldurado, de onde parte uma cruz latina, ladeada por cruzes incisas, rematando por uma cruz inscrita num círculo. Junto a este, surge a estação arqueológica do Mileu *2 (v. IPA.00003923).

Descrição Complementar

Utilização Inicial

Religiosa: capela

Utilização Actual

Religiosa: santuário

Propriedade

Privada: Igreja Católica (Diocese da Guarda)

Afectação

Sem afetação

Época Construção

Séc. 11 / 13 (conjectural) / 20

Arquitecto / Construtor / Autor

ARQUITETO: Luís Amoroso Lopes (1953). EMPREITEIRO: José Amaro Barata (1979-1980); Manuel Domingues Chaves (1970); Saúl de Oliveira Esteves (1953, 1957); Zeferino Joaquim Rosas (1967-1968).

Cronologia

Séc. 06 - séc. 07 - reconstrução no condado de D. Henrique ou no reinado de D. Afonso Henriques; séc. 11 - templo pagão, depois cristianizado e relacionado com os caminhos de peregrinação para Compostela (RODRIGUES, MARQUES, que atribui a construção ao séc. 10); séc. 12 - construção de raiz (AGUIAR); séc. 13 - feitura do arco triunfal e rosáceas (RODRIGUES); alterações no reinado de D. Pedro I; 1260, 16 julho - no documento que divide as paróquias entre o bispado da Guarda e o Cabido da Egitânea, a igreja surge como pertencendo ao Bispado. séc. 13 - 14 - existência de duas "emparedadas" e uma albergaria; 1299 - Fernão Gil deixa dinheiro à emparedada do Mileu, por testamento; séc. 16 - alterações no Bispado de Pedro Vaz Gavião; pertence ao Padroado Real, apoderado e restituído pelo Bispo Mestre Vicente; 1574 - a igreja pertence ao padroado real e integra o território da Diocese da Guarda; séc. 17 - substituição da cobertura (GOMES); padroado dado a Diogo Gomes de Figueiredo, que o terá legado a Claudio Romanete, químico estrangeiro; provável colocação da sineira na empena; séc. 18, início - Frei Agostinho de Santa Maria descreve a Igreja do Mileu como sendo uma das mais antigas da zona, sendo possível que surgisse sobre um templo romano; refere uma imagem antiga, de madeira, com dois palmos de altura, que, por vezes recebia roupagem; séc. 18 - execução de uma imagem de roca, com olhos de vidro; séc. 18, 2.ª metade - execução do retábulo colateral; séc. 19 - abertura de janelas na nave e capela-mor, reparação do telhado e provável colocação do altar-mor e púlpito em talha, construção do coro-alto; 1941 - o Governo Civil da Guarda alerta para o estado arruinado da capela; 30 Setembro - pede-se a organização da proposta de classificação do imóvel; 1946 - a Câmara Municipal solicita a classificação do imóvel como Monumento Nacional; 1949 - a capela encontra-se caiada, mas quase a ruir, com a fachada S. escorada, por ordem dos Serviços de Urbanização do Distrito da Guarda, procedendo-se, de imediato, a um orçamento para a sua reconstrução, que só se viria a concretizar-se em 1953; 1952 - durante as obras de ligação do centro da cidade à estação, são descobertos vestígios arqueológicos junto à capela; junho - escavações no local, levadas a cabo pelo Major Luciano Cardoso; 1953 - obra da DGEMN que envolve a deslocação do púlpito para junto do arco triunfal; feitura de tocheiros em ferro para colocar no altar-mor, a executar em cantaria; equaciona-se a hipótese de construir uma sacristia adossada à capela-mor, com a remoção do cemitério, ideia reiterada em 1959; Adriano Vasco Rodrigues descobre que o puxador do portal principal é um bracelete de bronze pré-histórico, fazendo-o remover para o Museu; 17 junho - pede-se à Câmara Municipal informações sobre o arranjo da estrada junto ao imóvel, para considerar o futuro arranjo do adro; 1953 - 1957 - intervenções de restauro da DGEMN, adjudicadas ao empreiteiro Saúl de Oliveira Esteves; 1954, 11 maio - pede-se a transferência para o Museu da Guarda do torso romano, achado durante as obras nos paramentos da capela; achou-se também uma escultura romana, transformada num São Sebastião; 19 maio - a DGEMN concorda com a transferência; 1955 - verifica-se a necessidade de vedar o espaço das ruínas; 1957 - construção de um novo cemitério, para não se procederem a enterramentos no que ficava anexo à capela; 1958, 06 junho - a Direção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes exige que a Confraria da Capela do Mileu demolisse o edifício que construiu adossado à residência do sacristão e que removesse os objetos colocados no interior da capela (mesas, andores, cadeiras); 1959 - Bairrão Oleiro pronuncia-se, a pedido do arquiteto Amoroso Lopes, sobre as ruínas, considerando que estas deveriam ser protegidas por um muro do tipo utilizado em Conímbriga, mas que não escavassem mais sem uma visita dele ao local; 1975 - a Secretaria de Estado da Cultura informa que o cruzeiro se encontra em péssimo estado de conservação; 1979 - denunciada a construção de casas dentro do perímetro da Zona de Proteção, licenciadas pela Câmara, em terrenos vendidos pela mesma, projeto que teria sido rejeitado, no ano anterior, pela Secretaria de Estado da Cultura; perante as pressões, as obras foram embargadas pela Câmara; 1980 - a Câmara embarga a obra do telhado, tendo a capela ficado destelhada vários anos, alegando que não fora consultada relativamente ao projeto, arrastando-se a contenda, com pareceres jurídicos sobre a legitimidade da Câmara; 2006 - o projeto de recuperação da capela foi, provisoriamente, abandonado por falta de verba.

Dados Técnicos

Sistema estrutural de paredes portantes.

Materiais

Estrutura em cantaria de granito; cornijas, cruzes, cunhais, modinaturas, arcos, pavimento, altar e mísulas em cantaria de granito; coberturas e portas de madeira; janelas com caixilhos de chumbo e vidro incolor: telhados com telha cerâmica de meia-cana.

Bibliografia

AGUIAR, Carlos Alexandre - Origens da Cidade da Guarda. Guarda: 1942; Boletim da Capela de Nossa Senhora Mileu. Lisboa: Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, 1954, n.º 78; CASTRO, José Osório da Gama - Diocese e Distrito da Guarda. Porto: Typografia Universal A Vapor, 1902; DIONÍSIO, Sant'Ana - Guia de Portugal. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1924; «Falta de verbas adia recuperação da Capela do Mileu». Notícias da Covilhã. Covilhã: 30 novembro 2006; GOMES, Pinharanda - História da Diocese da Guarda. Braga: Editorial Pax, 1981; MARIA, Frei Agostinho de Santa - Santuário Mariano... Lisboa: Officina de António Pedrozo Galrão, 1711, tomo 3; MARQUES, Carlos, in O Correio da Beira, 18.06.53; RODRIGUES, Adriano Vasco - Monografia Artística da Guarda. Guarda: Câmara Municipal da Guarda, 1984; SANTOS, Reinaldo dos - O Românico em Portugal. Lisboa: Editorial Sul, 1955; SERRÃO, Joaquim Veríssimo - Livro das Igrejas e Capelas do Padroado dos Reis de Portugal - 1574. Paris: Fundação Calouste Gulbenkian Centro Cultural Português, 1971.

Documentação Gráfica

IHRU: DGEMN/DSID

Documentação Fotográfica

IHRU: DGEMN/DSID, SIPA; Diocese da Guarda: Departamento do Património Cultural; Associação de Reitores dos Santuários de Portugal / Paulinas

Documentação Administrativa

IHRU: DGEMN/DSARH-010/113-0049, 010/113-0052, DGEMN/DSID-001/009-1018, 001/009-1019/1/2, 001/009-006-1055/2

Intervenção Realizada

DGEMN: 1953 - picagem de rebocos e apeamento das paredes testeira e fundeira, com a sua reconstrução, substituindo-se os elementos deteriorados; limpeza das cantarias exteriores e refechamento das juntas; demolição das paredes existentes sobre a cornija; levantamento e arrumação dos altares da nave; apeamento do coro-alto e escadas de acesso; apeamento e reconstrução do pano mural lateral sul, com substituição de silhares deteriorados; reparação da armação do telhado no local; reparação e limpeza do púlpito; restauro da rosácea, óculo e cachorrada; execução de teto em apainelado de madeira de castanho, assente em sistema de vigamento, e colocação de telha; limpeza do pavimento em cantaria; rebaixamento do adro para achar as soleiras das portas, conforme proposta do arquiteto Luís Amoroso Lopes, em vestoria à capela; colocação de vitral, armado em caixilhos de chumbo nas frestas; colocação de portas de madeira; reparação do altar-mor; instalação elétrica; limpeza do adro envolvente e do cruzeiro; a obra foi realizada por Saúl de Oliveira Esteves; 1954 / 1955 - mudança da pia de água-benta, escavação do terreno do cemitério para o nivelar; arranjo da casa anexa, para a transformar em sacristia e montagem da sineira na mesma; construção de mísulas para imaginária; reparação do muro que envolve o cemitério; colocação de uma tapeçaria no portal axial; levantamento do pavimento e início das obras de escavação; apeamento e reconstrução da empena do arco triunfal e do cunhal do lado S. da capela-mor; 1959 - arranjo da zona envolvente com a construção de uma sebe e plantação de coníferas; 1960 - reparação e limpeza da cobertura; 1967 - colocação de telhas novas na cobertura e limpeza da mesma; restauro da cruz da empena; consolidação de um cunhal da nave; 1967 / 1968 - arranjo da instalação elétrica, com a colocação de pequenos projetores e quadro de distribuição, adjudicado a Zeferino Joaquim Rosas; 1970 - levantamento de telha para remoção de um barrote apodrecido e colocação de nova; construção de uma porta de madeira almofadada para o quadro elétrico; execução de uma cruz "de feição românica", para a empena da fachada principal, adjudicada a Manuel Domingues Chaves; 1975 - Iluminação do exterior; 1979 / 1980 - reparação da cobertura e execução de beirado, adjudicada a José Amaro Barata.

Observações

*1- esta pertencia à capela, onde surgia em forma de sineira de volta perfeita, assente em impostas salientes e rematada por cornija, com cruz latina ao centro. *2 - o topónimo "Mileu" é um termo francês ligado a tecido medieval. *3 - o portal axial tinha uma argola, que constituía uma "viria" lusitana, datável da Idade do Bronze ou da II Idade do Ferro, destinada a proteger a parte superior do braço do guerreiro. As obras da DGEMN alteraram o interior, que era rebocado e pintado de branco, percorrido por lambril esponjado, elemento que surgia à volta dos vãos e arco triunfal. Tinha coro-alto de madeira com guarda vazada por motivos geométricos. No lado da Epístola, existia um retábulo colateral, de planta côncava, de um eixo composto por duas colunas de fuste liso e capitéis coríntios, assentes em plintos paralelepipédicos almofadados e encimadas por fragmentos de frontão, rematando em espaldar recortado, com amplo resplendor; ao centro nicho contracurvo, tendo altar paralelepipédico. A capela-mor tinha uma estrutura retabular de madeira em branco, revivalista, composta por três eixos definidos por quatro pilares, rematados em pirâmides, com tribuna central em arco de volta perfeita, rodeado por moldura toreada, assente em colunelos finos, flanqueada por dois nichos semelhantes, envolvidos por elementos fitomórficos vazados; ao centro, trono com a imagem e nas laterais, mísulas suportando Nossa Senhora de Lourdes e Santa Filomena. Na base, sacrário em forma de templete do século XVIII; altar paralelepipédico. Os eixos laterais formam dois nichos em arco de volta perfeita, assente em colunas de fuste liso e capitéis fitomórficos, assentes em altos plintos paralelepipédicos, na base dos quais surgem apainelados com motivos fitomórficos com a imagem de Santo António no Evangelho e Sebastião no lado oposto.

Autor e Data

Margarida Conceição 1991 / Paula Figueiredo 2008

Actualização

 
 
 
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